sábado, novembro 11, 2006

A Escada

Em primeiro lugar agradeço ao Bernardo a oportunidade que me deu de poder participar de forma mais activa no seu blog, onde, apesar do seu curto período de existência, já tantos assuntos já foram debatidos com maior ou menor fulgor.
A escolha do tema para escrever num blog como este não é de todo “pacífica” e foi sem dúvida uma escolha que exigiu um responsável período de reflexão. De politica já muito e bem se escreveu e já muito se discutiu, de viagens e futebol (revestindo-se este último assunto de menor relevo num panorama blogista apesar de ser adepto pouco racional da modalidade em geral e em particular do Benfica) fala-se semanalmente havendo autores específicos para estes dois assuntos. De questões jurídicas não percebo nada e a minha área (Engenharia Civil) tenho a convicção que provocaria incontroláveis bocejos e uma sonolência maçadora. Como “escritor móvel” decidi optar por uma reflexão mundana e o menos pretensiosa possível, que poderá e deverá ser comentada por quem achar que o artigo possa trazer algo de novo a este espaço.

Quando, algures na pré-história, um homem já bípede observou uma pedra a rolar por uma encosta inclinada e concluiu que o conceito da forma circular a que mais tarde decidiu chamar de roda daria mais jeito para puxar carroças que os blocos brutos e indefinidos que se usavam na altura, estava longe de pensar nas repercussões que teria a sua invenção. Um pouco antes já um primo dele tinha percebido que a carne sabia melhor se estivesse mais quentinha e tostada. Assim, quando estava a fazer música com duas pedras e uma faísca surgiu, ele aproveitou-a. Tiveram ideias, aproveitaram-nas e o mundo avançou um bocadinho.

Uns milénios mais tarde no séc. XVI um Português chamado Fernão de Magalhães farto de se sentir humilhado pelo rei do seu país (na altura era D.Manuel I), que se recusava a patrocinar uma expedição às ilhas das especiarias tendo como base a convicção que a América do Sul não estava ligada ao pólo Sul, atravessou a fronteira e convenceu o então rei de Espanha D.Carlos I a pagar-lhe o bilhete da viagem. A sua perseverança permitiu-o realizar aquele que é hoje considerado como o maior feito da navegação marítima de sempre, a descoberta e travessia do agora chamado estreito de Magalhães e a realização da primeira viagem de circum-navegação. Fernão de Magalhães morreu no decorrer dessa expedição por motivos alheios ao objectivo central da expedição mas o mundo avançou mais um bocadinho. Afinal a terra era redonda.
Escolhi estes dois exemplos, o primeiro porque serviu de introdução ao que queria falar e o segundo porque admiro profundamente a coragem e tenacidade da personagem retratada, pela importância do seu feito e por ser Português. O mundo avança porque foi empurrado, primeiro pela natureza no Big-Bang e depois por um grupo de homens e mulheres que pararam um pouco para pensar, tiveram ideias e concluíram que o balanço de as expor, apesar das consequências físicas e morais que poderiam enfrentar, era positivo para a humanidade. Assim aconteceu com Galilieu quando acabou com a arrogância e ignorância de se pensar que a terra era o centro do universo ou mesmo quando Sir Thomas Moore decidiu entregar a cabeça quando, fiel aos seus princípios, não concedeu o divórcio ao louco do Henrique VIII. Mais recentemente quando Bill Gates em 1985, com borbulhas na cara e óculos dignos de quem nunca tinha jogado à bola na vida (ou baseball já que estamos na América) disse que daí a dez anos cada pessoa teria um PC - Private Computer - a gargalhada deve ter sido geral e teve de ser a IBM a aproveitar a ideia do jovem visionário já que os imperadores da Apple Macintosh desacreditavam o jovem e agora choram terem-no feito. Já em 2004, na altura do Euro realizado em Portugal, um adolescente de 19 anos decidiu que seria boa ideia pôr bandeirinhas nas janelas para apoiar a nossa selecção nacional. A moda pegou, Portugal chegou à final. Obrigado Bernardo.

Em todas as épocas, em todos os séculos as pessoas distinguem-se pelas iniciativas que têm e pela forma como lutam por elas. Nos dias de hoje, falta-nos espaço para pensar e por vezes acomodamo-nos tristemente ao corriqueiro e desprezamos as nossas ideias e sonhos, classificando-as como inatingíveis ou patéticas. Fazemos mal.
Para finalizar (porque não quero “pseudo-intelectualizar” este artigo) lembro-me sempre de um livro para crianças que li quando a criança ilustrada conta à mãe que subiu a escada e esteve no sótão a brincar com tigres e macacos, que tinha feito uma cabana com lianas e folhas de palmeira ao que a mãe respondeu: “- Filho mas nós não temos sótão! A criança, desconsolada, diz então para si: - Coitada da minha mãe ainda não encontrou a escada…”

Fausto Lopo de Carvalho

1 comentário:

Anónimo disse...

É a visão e a coragem de a realizar que distingue a raça humana das restantes...

Uma ideia que não é posta em prática (ou pelo menos partilhada) perde existência e utilidade para todos...

Recomenda-se, na esteira do texto do Fausto, a peça que está no Teatro Aberto, se não me engano por mais duas semanas apenas, uma vez que é já uma reposição. É sobre a vida de Galileu e a vontade dos homens não aceitarem só o que lhes dão e quererem algo mais para si e para os seus...

Votos de uma semana em grande e Um abraço a todos os opinários,

Webdesing: Francisco Pinto Coelho (francisco.coelho@tagus.ist.utl.pt) 2007